As muitas titulações de Jorge
O Cais
Nº 129
Edição: fevereiro/2003
Conheci Jorge Alberto Áscoli em março de 1997, quando ele participou da oficina de textos dinamizada por Lena Jesus Ponte e por mim, naquela oportunidade realizada no espaço cultural da Associação Atlética Banco do Brasil (AABB/Niterói).
O Centro Cultural Délcio Coutinho Vasconcellos situa-se num bosque, à direita de quem entra na sede social da AABB. A ele se tem acesso percorrendo uma ladeira íngreme. O sacrifício de enfrentá-la possui compensações. A Casa Branca, conforme se tornou conhecida a construção situada no topo da colina, acalma e inspira.
Jorge Áscoli, à época, já passara dos oitenta anos. Mesmo assim, enfrentava galhardamente o caminho alcantilado. Curioso, ávido por absorver conhecimentos, feliz pelas novas amizades que passara a cultivar, participou efetivamente da oficina. Gentil, voz mansa, olhos azuis e curiosos, gestos suaves, sua presença a todos cativava.
Por sugestão minha e de Lena, passou a frequentar, nas manhãs de sábado, a Livraria Ideal. Lá, reencontrou Luís Antônio Pimentel. Ao revê-lo, o poeta o saudou amistosamente: “Como vai passando o senhor ministro?”. Pimentel recordava antigo tratamento dedicado ao amigo, do tempo em que os ministros possuíam, invariavelmente, a altivez e a nobreza das atitudes de Jorge Áscoli.
A partir daí, Lena, Sandro Rebel e eu passamos a reverenciá-lo de maneira carinhosamente brincalhona: além de ministro, marechal, embaixador, presidente, senador… A cada cumprimento, um título diferente. Jorge Áscoli sorria e lá ficávamos nós a conversar fiado no burburinho do Calçadão da Cultura. Ora ele nos falava de Vitória, a bisneta querida, ora comentava a respeito de sua atuação como figurante em novelas da TV Globo, ora nos revelava o teor da trova que acabara de tecer, ora nos dizia do seu passado de jogador de basquete, de suas incursões pelas rodas boêmias no tempo da juventude, de suas idas aos shoppings, atraído pelo pulsar da vida que, segundo ele, brota nesses templos do consumo.
Sem aviso prévio, Jorge Áscoli deixou de comparecer à Ideal. Na data de seu aniversário, por via telefônica, busquei parabenizá-lo, quando soube: de maneira sofrida, as últimas páginas de sua história estavam sendo viradas. Recentemente, num final de semana encalorado, o livro se fechou. Busco, para esta despedida, a titulação mais significativa e logo a encontro. Em nome de Luís Antônio Pimentel, no de Lena, no de Sandro Rebel e no meu próprio, permito-me proferi-la: AMIGO Jorge, imensa saudade.